Por Maria Carolina S. Marques
Farmacêutica formada pela Universidade Federal
do Ceara/CE, Mestre pela Universidade de Lavras/MG, doutoranda do programa de Pós-Graduação
em Saúde e Desenvolvimento da Região/UFMS e professora de Universidade Católica
Dom Bosco/UCDB.
Acredito que o melhor meio para
explicar o porquê desse meu amor pela área de Produtos Naturais, seja começar
explicando onde e como tudo isso aconteceu. Em primeiro lugar, desejo
proporcionar com esta contribuição expositiva, o despertar nos acadêmicos, de
qualquer área, ou em participar de monitorias, iniciação cientifica e projetos
de extensão. Para muitos, pode parecer só uma forma de ganhar dinheiro, por
meio das bolsas, que normalmente são adquiridas no aporte desses tipos de
trabalho; no entanto, posso afirmar que o que se ganha e muito mais do que
isso. Independente da área de atuação e do trabalho desenvolvido, todos eles
ampliam a visão sobre qual e o nosso papel nesse contexto, e para você, aluno, poderá
direcionar a sua futura atuação profissional. A monitoria e a iniciação
cientificam permitem aos alunos irem alem da sala de aula. Deixa-se de ser um
mero receptor de informações para ser o construtor de conhecimentos, ou seja, você
passa a apresentar o diferencial, tão importante nesse universo cada vez mais
competitivo. Falo por experiência própria. Durante a minha graduação, como dos
demais profissionais, deparei com as mais diversas disciplinas, umas, que não
tive muita afinidade e outras, que me apaixonei a primeira vista. Assim, dentre
essas, a Farmacognosia, disciplina que tem como foco o estudo da planta ao
medicamento, despertou em mim o interesse, a necessidade, a sede de ampliar
meus conhecimentos, estende-o ao campo do conhecimento cientifico; o que me
impulsionou, no ano seguinte, a ser monitora. A partir desse momento, entrei na
área de Produtos Naturais. Foi na monitoria que aprendi e desenvolvi trabalhos de
pesquisa, tive a oportunidade de me aperfeiçoar nas técnicas laboratoriais, o
que nem sempre e possível nas aulas praticas rotineiras das disciplinas e,
principalmente, compartilhei da experiência e da sabedoria de meus professores.
Naquele momento, sem saber, comecei a traçar o meu futuro profissional. Da
monitoria fui para a iniciação cientifica, depois, já formada, comecei a atuar
como professora, o que me levou mais adiante ao mestrado e hoje, ao doutorado. Em
todas essas etapas, trabalhando diretamente com essa linha de plantas – princípios
ativos – química de produtos naturais. Porem, ao longo desses anos de trabalho,
estudos e pesquisas, algo sempre me incomodava: qual tem sido o retorno disso
as pessoas, as comunidades, enfim a sociedade? Será que o meu trabalho, por mais
simples que seja, pode gerar produtos, conhecimentos palpáveis, uteis, alem de
uma mera tese de doutorado e um título? Por essa razão, foi tentando atender a
esse meu anseio, que em meu doutorado propusemos estudar as plantas utilizadas
pela população, buscando dar-lhes um respaldo cientifico por meio da investigação
de suas atividades biológicas, como também, toxicológicas. Acreditamos, assim,
que ao gerarmos um trabalho que mostre que essas plantas apresentam, sim, atividades
biológicas, como capacidade antifúngica, antibacteriana, antioxidante, ou quem
sabe, citotóxica[1], e a possa dai gerar substancias bioativas e com
potencialidades para um fármaco; essas plantas possam ser valorizadas e
deixadas de serem vistas como os chazinhos da vovó, aliaremos, então, a
sabedoria popular a cientifica. Alem disso, procuramos atender também as nossas
necessidades regionais, pois todas as atividades supracitadas são importantes,
mas temos aqui, em nosso estado e em nosso município, Campo Grande, a realidade
da leishmaniose. Uma doença grave, endêmica e com poucos tratamentos disponíveis,
e com muitos efeitos adversos. Por esta razão, estamos avaliando o potencial antileishmania
de diversas plantas, muitas típicas do cerrado, por meio de testes in vitro[2]
com as formas promastigotas[3] de cepas[4] de Leishmania. Baseando-se nessa avaliação,
faremos o fracionamento, extração e purificação de substancias bioativas,
processo denominado de estudo fitoquimico biomonitorado. Dentro ainda da linha
de valorização dessas plantas, avaliaremos o potencial mutagenico[5] de alguns
extratos, gerando informações relativas a toxicidade dessas plantas. Nesse
trabalho, ate o momento, avaliamos as atividades biológicas de vinte e três
extratos de onze espécies diferentes, todas com uso popular, e constatamos que
ha plantas com potencial antifúngico, antioxidante e citotóxico. E o melhor,
quatro extratos apresentaram atividade antileihsmania, sendo um extrato com uma
IC50 de 6,25 μg/mL. Numa segunda fase, iremos para o fracionamento do extrato
mais bioativo. Considero, portanto, que as minhas experiências vividas desde a graduação,
possibilitaram construir o meu perfil profissional, como docente e
pesquisadora; o que não significa que ele esteja ja pronto e acabado, pelo
contrario, a cada dia descubro que “muito pouco sei e que nada sei”. Entretanto
este meu amor aos Produtos Naturais vem se consolidando ao longo desse tempo
que convivo e vivencio este processo, aprendendo e respeitando a importância
que e para nos essas plantas maravilhosas que podem exercer papel fundamental
na solução de problemas vivenciados, por vezes, tão próximos de nós.
Glossário de Referencias
[1] capacidade citotóxica: capacidade de intoxicar uma célula
e/ou impedir o crescimento de um tecido celular.
[2] in vitro: expressão latina que significa “em
vidro”, e utilizada para designar todos os processos biológicos que ocorrem em
um ambiente fechado e controlado de um laboratório e, geralmente em recipientes
de vidro.
[3] promastigotas: forma flagelada e extracelular do
parasita do gênero Leishmania. Apresenta corpo alongado, medindo entre 14 e 20mm
e flagelo livre.
[4] cepas: espécie ou “raça” de um determinado micro-organismo.
[5] mutagenico: um agente físico, químico ou biológico
que pode causar um dano na molécula de DNA (mutação), ao entrar em contato com
as células de um organismo.
"Trate bem a terra. Ela não foi doada a você
pelos seus pais. Ela foi emprestada a você pelos seus filhos".
Proverbio antigo do Quenia
ATENÇÃO!
Essa matéria foi publicada na 4ª edição do informativo Principia, em 2009.
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